Supefície Vista
Acervo Diária, São Paulo • novembro/2025
Exposição individual
Participação: Leticia Yumi
Texto curatorial: Yohannah Oliveira
O olhar precede a vontade; é ele quem primeiro desenha o mapa do que merece nossa atenção. Ele percorre a paisagem à frente, atravessando luz e matéria com a delicadeza daquele que busca compreender, movido pela faísca do desejo e da curiosidade. Nesse gesto sutil e subconsciente, estabelece-se a origem de toda percepção: é o olhar que guia o raciocínio, não o contrário. Diante da paisagem, nossa mente apenas acompanha o percurso inaugurado pelos olhos, explorando aos poucos as camadas do visível que se revelam depois do primeiro impacto.
Em Superfície Vista, Raphael Dias apresenta sua exposição individual inédita composta por tapeçarias tecidas em lã natural e sisal e por intervenções cerâmicas em colaboração com Leticia Yumi. As obras se infiltram e se expandem entre si e pelo espaço como líquens sobre as rochas, instaurando camadas de forma, textura e presença. Nesse conjunto, o artista explora a paisagem de maneira sutil e refinada, partindo do ímpeto do olhar — primeiro gesto de aproximação — que registra por meio da fotografia. São as fotografias que orientam tanto seu processo compositivo quanto a seleção de cores exploradas no ambiente, capazes de transformar cada fragmento da paisagem em um pequeno universo próprio.
As composições do artista valorizam o detalhe como um universo próprio, onde cada fragmento da trama ganha protagonismo. A mescla inédita entre lã e sisal cria variações de textura e altura, intensificadas pelo uso das franjas, que surgem como extensões orgânicas das tapeçarias. Esses elementos evocam diretamente a espontaneidade e o crescimento irregular dos líquens, inspirando uma presença que se expande e se desdobra além da superfície tradicional do tecido. O resultado é uma superfície viva, repleta de volumes, sombras e ritmos sutis, convidando o olhar tanto à imersão quanto à descoberta atenta.
Na experiência proposta por Superfície Vista, somos convidados a mergulhar não apenas no universo delicado do artista, mas também nas múltiplas camadas da nossa própria percepção. A experiência do olhar sobre suas tapeçarias e intervenções é um convite à contemplação que se estende muito além da tradição milenar da prática têxtil, revelando nuances que escapam ao olhar comum e sugerindo um diálogo íntimo entre obra e observador. Nesse encontro, o que emerge não é apenas a superfície visível, mas uma abertura para explorar dimensões internas, geralmente invisíveis, que ampliam nossa relação com o mundo e conosco mesmos.
Vesa 360
Pavilhão da Bienal de São Paulo • junho/2025
Exposição coletiva
Nesta obra, o fio é mais do que matéria, é metáfora. De um lado, a frente: verde, visível, feita de luz e aparência. Do outro, o verso: azul, silencioso, lugar de mistério e potência. Um revela o que mostramos; o outro, o que sentimos e nem sempre conseguimos dizer. Hora água, hora floresta. Uma oscilação entre dois mundos.
Fios se soltam e escorrem, como pensamentos que escapam. A tapeçaria também carrega o tempo. As linhas fluem como os dias: escorrem, desaparecem. Cada ponto tenta fixar o instante. E assim como nós, esta peça se transforma conforme o olhar de quem a observa. Feita de frente e verso, de luz e sombra, de escolhas e hesitações, ela nos lembra que tudo isso é igualmente essencial.
Threads of Tomorrow
Museu têxtil • New Orleans • março/2024
Curadoria: Rodrigo Frazão
Exposição coletiva virtual
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PERTO
FLO Atelier Botânico
São Paulo - SP • dezembro/2023
Curadoria: Karen Suehiro
exposição individual
"Longe. Talvez seja a palavra que mais poderia se encaixar no hoje. O quão presente você está ou se sente agora? Nesse universo cosmopolita, em que as buzinas são as notas musicais que acompanham o passar das horas e os pontos de luz são as telas que tomam conta do nosso olhar, fazem o ‘vazio’ ser o ‘preenchido’ da alma. A vontade aqui é que a alma preencha o vazio. Ver, sentir, ouvir. Sentidos humanos que nos fazem preencher a alma de VIDA, apelo esse de Raphael Dias e FLO Atelier Botânico, com a exposição PERTO.
Pulsando tropicalidade é como fazem o ser humano se (re)aproximar da natureza. Através de técnicas de tufting, Raphael nos faz navegar pelas cores, texturas, formas e muito pelo tempo. Recortes em papel e colagens são seus estudos que fazem a sua alma cruzarem seu amor pelas águas das praias, a calma do toque dos pés nas pedras e a beleza do amanhecer dos dias pelas lãs e seus milhares de pontos, nas tapeçarias acolhedoras presentes em cada superfície. E, através da criação de arranjos, curadoria e muito design, FLO Atelier Botânico nos faz entrar de alma e corpo no jardim tropical, resgatando a beleza e riqueza das plantas brasileiras.
Juntos, fazem os pássaros e a brisa dos ventos serem as notas musicais, a luz do sol ser o calor que sentimos na pele e a sombra que vemos no chão quando batem nas diferentes curvas e texturas perto da janela. É possível estar presente e sentir amor pela vida. PERTO é um perfeito ponto de partida."
Karen Suehiro- curadora
MODERNO TROPICAL
Acervo Diária
São Paulo - SP • setembro/2022
Curadoria: Heloisa Strobel
exposição individual
Com um olhar fotográfico, puro e apurado, a estética de Raphael Dias percorre diversas leituras de natureza. Artista visual de muitas facetas, ele inicia essa trajetória na fotografia, passa pelo desenho e pela colagem - e deságua na tapeçaria - plataforma onde o artista apresenta sua força visual com profundidade de texturas e de pesquisa histórica.
A trajetória do artista se interliga pela composição de uma forma geral - sempre reordenando informações de forma estética com função - a exemplo da loja Casa Diária e dos espaços que permeiam seu cotidiano, como o próprio atelier do artista e sua casa. Um olhar sobre o viver, o habitar, a arquitetura e a história dos espaços construídos.
Em Moderno Tropical, esse olhar mergulha em uma pesquisa profunda sobre o icônico Edifício Capanema - antigo Ministério da Educação - marco modernista histórico e que carrega consigo outras fontes de representatividade brasileira como as dezenas de obras de arte - da pintura à tapeçaria - em seu interior.
A partir do resgate dessas imagens - todas elas privadas dos olhos do público, já que o edifício encontra-se fechado desde 2014 - Raphael percorre com seu olhar cada ambiente e cada signo do projeto, celebrando suas formas em novas composições - representadas em suas obras. Cada tapeçaria é uma arquitetura de planos e de relevos que se encontram em formas puras e orgânicas. O processo de colagem que antecede cada composição pode ser visto em limites construídos com pontos de lã, mas que muitas vezes parecem papéis rasgados.
É essa composição de planos, que se apresentam em blocos de cores vívidas e harmônicas, que vai nos conduzir à um passeio pelo Edifício Capanema. Fechado, condenado aos caprichos do poder público, ele ganha escape sob este olhar texturizado do artista na tapeçaria, nos conduzindo ao questionamento sobre a quem pertence o direito de possuir o que construiu nosso país.
Heloisa Strobel - curadora
Em agosto de 2021 leio a notícia sobre o Palácio Capanema estrelar em uma listagem entre os possíveis imóveis a serem vendidos pelo governo federal, durante o mandato de Jair Bolsonaro. Refleti sobre tudo que esse edifício e as obras no seu interior representam para a nossa cultura.Não tive o prazer de visitá-lo antes do fechamento para reforma, visitei apenas seu entorno, no silêncio de uma manhã ensolarada de domingo. Contemplei de longe a impecável arquitetura modernista e através dos furos no tapume que circula o edifício avistei o afresco de Portinari, mergulhei na mistura de tons azuis. Também vi fragmentos dos jardins de Burle Marx em verdes intensos.Através da pesquisa para a presente exposição, imaginei uma visita ao palácio, em 1945, quando inaugurou e se materializou toda uma idealização de futuro e a utopia de um Brasil moderno. E agora, um ano depois de ler a notícia, apresento tapeçarias que representam não só uma visita imaginária ao palácio, mas também ao meu universo interior. Uma visita ensolarada, como aquela manhã de domingo.Na busca do sol, diante da turbulência sócio econômica atual e dos dias nublados da vida, as obras aqui tecidas são uma homenagem a esse edifício ícone do modernismo brasileiro, à todas as pessoas que fizeram parte da sua concepção e ao povo brasileiro. Nossa história cultural não está à venda e não será silenciada.
Raphael Dias, 2022.
Um edifício de 14 pavimentos que carrega consigo o marco de maior ícone do movimento modernista nacional e habita o centro do Rio de Janeiro. Conhecido como Palácio Gustavo Capanema, em homenagem ao seu idealizador, ou ainda Ministério da Educação e Saúde, uma alusão à função para qual foi projetado, durante o segundo mandato de Getulio Vargas, em tempos onde os dois ministérios ainda eram uma única pasta.
O prédio, em reforma desde 2014 e fechado para visitação, foi eleito como o edifício mais avançado do mundo em construção, no início da década de 1940 pelo Museu de Arte Moderna de Nova York. É o primeiro a usar os pressupostos da arquitetura modernista em escala monumental. Vanguardista desde a sua concepção, foi projetado em 1936 por uma equipe de jovens modernistas brasileiros: Lucio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Reidy, Jorge Moreira, Carlos Leão e Ernâni Vasconcelos - sob coordenação do primeiro e com orientação de Le Corbusier.
Jóia da arquitetura e da história brasileira, conta com o paisagismo de Roberto Burle Marx e carrega mais de 50 obras de arte e mobiliário dos principais artistas brasileiros. Obras de Cândido Portinari - avaliado como um de seus principais acervos - pinturas e esculturas de Bruno Giorgi, Adriana Janacópulus, Celso Antônio e Jacques Lipchitz, entre outros. Sonho de um ministro moderno e modernista - Capanema foi conhecido por imbuir na educação um viés artístico e cultural e buscar um ideal de arte e civismo nacional - materializou a utopia de um país moderno, que prometia romper com o passado colonialista.
No auge da decadência cultural que atravessou o país, esteve cotado em 2021 como um dos imóveis a serem leiloados no “feirão de imóveis” da União, capitaneado pelo Ministério da Economia do atual governo. Tal heresia motivou a mobilização de diversos intelectuais e forças políticas nacionais, resultando no recuo da decisão e devolução do prédio à sua função anterior. Deverá ser reinaugurado ainda em 2022, abrigando diferentes órgãos e funções, como Funarte, Ancine, Ibram e Iphan.






















































